domingo, 17 de agosto de 2008

Um País sem Heróis


Ouvindo o ufanismo de Galvão Bueno, o telespectador desavisado pode ser levado a acreditar que o Brasil é uma potência injustiçada no esporte e uma fábrica de heróis olímpicos.

Nada mais equivocado.

O olhar solitário e reflexivo de Marily do Santos, 51ª colocada na maratona, diz muito mais de nosso país do que as lágrimas incontidas do medalhista do ouro na natação César Cielo.

É o olhar de um país triste e inseguro. Que diante de tantas dificuldades e desafios, tem dificuldade em acreditar que chegou tão longe e que não sabe ao certo o que esperar do futuro.

O Brasil não investe em esportes. Dizer que o faz é mascarar a realidade.

Prova disso é que os investimentos em ginástica olímpica não se reverteram em medalhas. Os resultados de nossas atletas nesta modalidade estão longe de serem motivo de deboche, mas revelam que mesmo quando há investimento eles são insuficientes ou mal empregados.

O desempenho dos atletas é muito mais resultado da determinação e esforço individual, mesclado com uma dose considerável de sorte e casualidade.

Estes atletas são heróis, mais ou menos anônimos, de um país em que as aulas de educação física são medíocres e não disciplinam seus jovens para a prática do esporte.

Inexistem investimentos em esportes de qualquer modalidade. Basta notar que, no país do futebol, os clubes de cidades pequenas estão à míngua por falta de investimento. Se empresas locais não se interessam por investir em times de futebol de suas próprias cidades, quem acredita que haverá investimentos para esportes sem espaço na mídia diária e cujas provas duram segundos ou no máximo minutos?

Talvez eu esteja enganado e o Brasil seja realmente um celeiro de heróis olímpicos.

Pois conseguir participar de uma competição de nível internacional e ainda se destacar entre tantos atletas de nível profissional, depois de passar quatro anos exercendo funções como cortador de cana, motorista de caminhão, doméstica, gari e tantas outras profissões não qualificadas, e ainda competir em nível olímpico com atletas garimpados e lapidados entre milhares de talentos é realmente uma tarefa hercúlea.

Mas nosso Brasil é o país do futuro! E mesmo depois do déficit de um malfadado Pan-americano. Depois de assumir o peso de organizar uma copa do mundo do futebol (não se engane, é mais fácil e muito mais barato que organizar uma olimpíada). Depois de uma campanha pífia (como representatividade do potencial esportivo nacional e não da coragem dos atletas brasileiros), ainda querem assumir o compromisso de sediar uma Olimpíada.

Então sejamos sensatos e trabalhemos para o futuro. Mas para um futuro possível.

Se começarmos agora a investir de fato no esporte, em doze anos seremos capazes de realizar algo parecido com a façanha que a China realizou com seus atletas. Quem sabe então este país possa conquistar umas 30 medalhas.

Enquanto não tivermos competições estudantis regulares. Enquanto não forjarmos campeões esportivos em abundância. Enquanto não investirmos o suficiente para que nossos atletas possam treinar aqui sem precisar migrar para outros países.

Enquanto isso, e quem sabe quanto mais não for feito, sejamos humildes e reconheçamos, estes homens e mulheres que vestem verde e amarelo são heróis!

Mas são heróis apesar do Brasil.